Autonomia, Responsabilidade e Liberdade - Entrevista Parte 1

in #anarchy7 years ago

Autonomia, Responsabilidade e Liberdade - Entrevista Parte 1
Este artigo já está publicado em 2 partes na língua inglesa em Autonomy, Responsibility and Freedom - Interview Part 1 e Autonomy, Responsability and Freedom - Interview Part 2
Introdução em 2016

- Os últimos eventos e o clima real em Steemit, fizeram-me ouvir uma entrevista que dei há mais de 20 anos, a Sara Aleixo, uma jovem cineasta que procurava inspiração para um filme que estava fazendo sobre a Autonomia.
Obrigado por seu espírito vívido e pela exímia condução desta entrevista feita no ano de 1995.
Mais tarde, foi publicado na Internet na língua portuguesa em 1996.
Transcrição exatamente "como foi" na fita do gravador.
Então eu decidi publicá-lo aqui para ajudar as pessoas a pensar mais sobre o que deveria ser diferente em sistemas autónomos descentralizados para revolucionar, corromper e tornar o Podercentralizado obsoleto e extinguir a principal ditadura da sociedade real que cada vez mais controla e manipula o fluxo de autonomia e liberdade.

É claro que para mim, anarquista há muito tempo, vejo novos valores para criar uma sociedade anarco-capitalista, que nunca foram mencionadas em todas as teorias do anarquismo são revolucionárias (mudar o sistema, mas com alternativas), rebeldes (contra o sistema para Criar alternativas) ou revoltar (destruir o sistema sem alternativas) métodos vistos no anarquismo social, anarquismo coletivista, anarco-comunismo, socialismo libertário, anarcosindicalismo, ecologistas sociais, anarquistas de bombas, anarquismo filosófico e individualista e outros
Este novo valor deve ser não virado para evitar crianças traumatizadas no mundo futuro.
Acho que uma criança que não é intimidada nunca vai intimidar outras, porque esta é a raiz dos problemas
Depois de abolir a escravidão, tentamos libertar os homens, as mulheres estão se a libertar, mas devemos liberar os últimos escravos, as crianças.
"Liberdade é o que faz com o que foi feito a si". - Jean-Paul Sartre
Se pararmos a violência que os nossos antepassados ​​usaram sobre nós e interrompermos o ciclo de transmissão para os nossos filhos, podemos ser livres e ajudar a criar um novo mundo.
As pessoas têm autonomia suficiente, estão felizes e sabem como viver num Mundo "Antagonista- Cooperativo" "competitivo-colaborativo" sem a interferência do Poder centralizado.
Desde o surgimento do Linu(s)(x) e do Código Fonte Livre sempre senti algum tipo de "conspiração"que poderia destruir a estrutura do Poder e dos sistemas centralizados, consubstanciando um mundo com mais ética e justiça global.
O Blockchain é uma prova viva de como uma invenção científica em "código aberto/source-code", usa o consenso descentralizado como uma prova definitiva de que não precisamos do poder intermediando o valor do dinheiro para poder sugar tudo.
Penso que a anarquia é definida no equilíbrio de três valores humanos fundamentais: Autonomia, Responsabilidade e Liberdade como os pilares da vida com de cada um e da comunidade.
Tenha em atenção que esta entrevista foi feita no final do século passado, por isso, comente, critique ou enfoque discrepâncias ou anacronismos com a vida de hoje e o que se tornou realidade.
Entrevista, dada a Sara Aleixo sobre a capacidade autonómica de cada pessoa , que tem como contraponto a afiliação (necessidade de depender de outrém), lendo também, por outro lado, a tendência para o sucesso (achievement capitalista), que tem duas componentes, a força para o Sucesso e a vontade para o Poder.
Verifica-se, nos testes aplicados, que a nossa população portuguesa e a maioria dos países que falam línguas "latinas" tem um grande pendor afiliativo, o que implica uma baixa capacidade autonómica. Por outro lado, verificou-se tem uma maior orientação para o Poder do que força para o Sucesso.

Introdução em 1995

Esta entrevista foi dada a Sara Aleixo e é sobre a capacidade autonómica (agir por si próprio) de cada pessoa em contraste com a afiliação (precisa de depender de outra pessoa), vendo-se que por outro lado existe uma tendência para o sucesso (realização no sentido capitalista), que tem dois componentes, a força para o Sucesso e vontade para o Poder.
Verificou-se, em testes, que por exemplo a população portuguesa tem grande dependência para a afiliação, o que implica possuir uma baixa capacidade autonómica. Além disso, existe uma maior tendência para o poder do que a tendência ao sucesso.
"A maioria das pessoas realmente não quer liberdade, porque a liberdade envolve responsabilidade e a maioria das pessoas tem medo de responsabilidade" - Sigmund Freud

Entrevista: Autonomia, Responsabilidade e Liberdade - Entrevista Parte 1


"A felicidade é um estágio intermediário entre escassez e excesso" - Ibsen [1828-1906]

Sara Aleixo - A pergunta principal, que está na base desta entrevista, é sobre a autonomia. O que é a autonomia?
Charlie - O que é a autonomia...Vai ser difícil, vai ser uma longa viagem...há muitas coisas...
Sara Aleixo - Há vários sentidos, não é?
Charlie - Sim, para mim autonomia ...põe a grande questão, isto irá começar na autonomia e acabar, penso, na liberdade.
Depois a questão tem que ser posta a nível pessoal, a nível de inter-relação e a nível das estruturas ideológicas sociais, é um bocado complicado!
Sara Aleixo - Ideológicas?
Charlie - Sim, há sempre uma estrutura ideológica cultural que condiciona a autonomia intra-individual, a autonomia de cada um.
Vamos lá ver, se eu lhe arranjar uma definição, autonomia talvez seja... é capaz de ser a capacidade de desenvolver uma tarefa, um pensamento, um objectivo, referenciando-me mais em mim próprio do que a uma fonte externa.
Portanto, as pessoas que não têm muita autonomia, para realizar qualquer coisa têm que perguntar àquele que consideram o chefe, o que é pressuposto ter autonomia, e isso varia dentro das várias culturas.
Sabe-se, cientificamente, que os americanos e os ingleses têm uma maior capacidade autonómica.
E houve um indivíduo que foi estudar isso para tentar descobrir porque é que essas pessoas eram tão autónomas... há uma obra que se chama A Ética do Protestantismo e o Espírito do Capitalismo, do Max Weber, que vai encontrar uma relação entre a autonomia cultural dos adultos, numa determinada sociedade, com a educação muito precoce das infâncias.

E verificou-se que as culturas mais latinas, a Europa do Sul, nas Américas do sul, nas Índias, não desenvolvem, nas crianças até à idade de um ano e meio, uma grande autonomia, enquanto os americanos são muito mais autónomos, porque obrigam as crianças até um ano e meio a tomar uma série de tarefas, como saber arrumar a sua roupa, saber vesti-la, saber comer com faca e garfo, a fazer uma série de tarefas com a ausência do pai ou da mãe, que as vai fazer ganhar muita autonomia,precisamente devido a essa situação.
Mas estes autores não desligam a autonomia de uma outra série de factores.
Eles estudaram quatro factores, estudaram o que era a tendência para o sucesso, depois põem a autonomia e um contraponto da autonomia, que é um outro factor chamado afiliação. Afiliação não tem a ver com pai e filho, e tem... afiliação quer dizer, exactamente, necessidade de outrém para agir. Puseram estes dois factores como dois pontos que definiam a tendência para o sucesso.
Claro que nós, com este chavão "tendência para o sucesso", não nos podemos desligar de todo, do modelo espiritual estrutural capitalista, não é? Portanto, a própria tendência para o sucesso é analisada em função do modelo capitalista.
Sabe-se que, num modelo capitalista, quem estiver inserido nele, para ter sucesso, tem que ter muita autonomia, pouca afiliação, tendência para o poder e tendência para o sucesso. São, no fundo, estes quatro factores que definem a tendência para o sucesso, sendo um deles a própria tendência para o sucesso.
McClelland, um que aplicou estes estudos a nível mundial, veio a descobrir que os americanos, por exemplo, têm uma grande tendência para a autonomia e para o sucesso e para o poder, a Europa do Norte apresentava também valores com grande tendência para a autonomia.
Depois aparece a Europa do sul, as Ásias e etc., em que as pessoas têm pouca autonomia e são muito afiliativas, ou seja, para agirem dependem muito dos outros e, por outro lado, já porque os modelos culturais capitalistas são menos desenvolvidos aqui, têm também menos tendência para o sucesso e menos tendência para o poder.
E também, talvez, porque o poder seja muito estruturado e estável nesses países, mais fascista, talvez.
E, afinal, nos países mais democratas, em que a democracia é mais interactiva e menos fascista, as pessoas têm muito mais autonomia e querem agir e depois isto acaba na liberdade.
O público latino, desde a Europa do sul e por aí abaixo, vive o que eu chamarei uma democracia fascista, porque, precisamente, não exerce a sua tendência para a autonomia.
"Votam pura e simplesmente nos políticos e estes acabam por fazer o que querem e não há interacção".
Enquanto nos outros países, onde as pessoas apresentam níveis de autonomia mais elevados, existe uma grande interacção entre o sistema político e o povo.
Convencionou-se a chamar democracia a tudo isto, mas não é, há uma grande diferença, mas que depois se vai descobrir que tem a ver com esses tais factores.
É a falta de autonomia, a falta de tendência para o sucesso e a... a... Eles estão separados. A tendência para o sucesso e para o poder está relacionada culturalmente e gera, não sei se é bom se é mau, mas gera uma maior adaptação ao sistema estrutural capitalista.
E o funcionar por si próprio e o ter valores de liberdade democrática e de liberdade política, jogam com a autonomia e com a afiliação.
Os latinos como são muito afiliativos e têm a tal sociedade capitalista menos desenvolvida, terão sempre estes factores em valores inferiores aos outros, que têm a tal educação precoce, voltando ao princípio, ao Max Weber.
Mas isto é o ovo e a galinha, ( que não duas unidades distintas mas um só processo)ou seja, se a sociedade é muito desenvolvida culturalmente e as pessoas têm muita autonomia, logo essas pessoas geram esse sentimento nas crianças e isto é sempre imparável.
O que isto dá, em termos estatísticos, é que cada vez mais os países mais desenvolvidos vão ter mais, porque isto é uma progressão aritmética em termos lógico-matemáticos e, portanto, cada vez mais vai haver uma distância em relação aos povos que têm baixo desenvolvimento.
E isto nunca mais acaba.
E, em última análise, a questão da autonomia leva-nos ao comunismo primário.
Ou seja, quando se chegar a um nível cultural mundial que a Internet e as comunicações facilitam por um lado, mas diminuem por outro (depois talvez explique isto mais à frente), mas, de qualquer maneira, quanto mais se desenvolverem os meios de comunicação, cada vez mais irá aumentar a autonomia pessoal, quanto o sistema educativo se desenvolver nos vários países, mais se irá desenvolver esta questão da autonomia.
E, voltando à questão do comunismo primário, vamos chegar à tal sociedade anárquica, no dia em que as pessoas tiverem super-valores autonómicos e, se calhar, já terão reduzido os valores do sucesso e do poder, porque penso que a evolução social também, daqui a milhares de anos, irá desviar a estupidez de caminhar para o sistema capitalista, em que se tem tudo materialmente e nada espiritualmente.
E, como eu penso que também vai haver, nas próximas centenas de anos, alguma mudança no sentido de vida, precisamente, devido às comunicações, as pessoas vão começar a eleger outros valores como o ócio criativo, a criatividade, a liberdade, o tempo disponível, se calhar vão reduzir as horas de trabalho, as pessoas virão a ter mais autonomia, e, depois chega-se àquilo que eu queria dizer, que eu não correlacionei ao princípio, mas há aqui um outro princípio que tem de ser correlacionado com isto tudo, em termos pessoais, que tem a ver com a responsabilidade.
No fundo, responsabilidade é um sinónimo de liberdade, quando se atinge o limite das duas coisas. Porque, autonomia é a responsabilidade de fazer as coisas sem prejudicar a outra pessoa que está à nossa volta.
Quando o mundo atingir um super-nível de autonomia mas com este sentido da responsabilidade, haverá a eliminação do factor principal da destruição humana, que é o poder. O poder só existe porque as pessoas não têm autonomia.
No dia em que as pessoas chegarem a um nível total de autonomia, não precisarão de líderes, de poder, e aí se chegará, talvez, ao tal comunismo igualitário, equitativo, da distribuição de bens.
Nos próximos duzentos ou trezentos anos, a lógica capitalista irá destruir, totalmente, o valor espiritual e a humanidade, e há-de chegar à altura em que sofre um choque e vai ter de começar a procurar novos valores espirituais.
E, se calhar, é essa autonomia... porque a autonomia também nos vai desligando da estrutura cultural dominante , não é? E, cada vez mais, vamos pensando mais por nós próprios e menos pelo que a cultura e a estrutura do poder nos manda pensar.
E isso traz a tal sociedade bonita, em que as testemunhas de Jeová acreditam, em que os leões pastam ao pé das pessoas, isto em sentido figurado, e em que já não há os tubarões, também em sentido figurado, os tubarões do poder.
E aí chegamos à tal sociedade equalitária, em que cada um é totalmente autónomo, mas tem a responsabilidade total de não fazer coisas que vão interferir com outrém.
E, pronto, já se disse bastante sobre autonomia.
Sara Aleixo - Falaste, principalmente, da estrutura social, cultural e política, não é? E, é claro que a liberdade do Homem enquanto pessoa está sempre relacionada com isso. Mas há possibilidade de autonomia no ser, na própria pessoa, mesmo vivendo numa cultura que ainda não atingiu esse grau de autonomia?
Charlie - O que eu penso é que, são os grandes artistas, os grandes filósofos, as pessoas que transformam um pouco o mundo, e até há muitos anos atrás, quando não existia a chamada cultura de massas, porque não havia sistemas de comunicação, e a comunicação estava muito vedada àqueles que viviam do ócio e do trabalho dos outros, aí havia uma cultura.
Depois, havia sempre umas ovelhas ranhosas, do extracto burguês ou até de classes em ascensão, pequeno-burguesas, mas havia sempre umas pessoas que tinham grandes graus de autonomia.
Sara Aleixo - E, o que é o grande grau de autonomia?
É um Picasso, que faz algo de totalmente novo, fora do inconsciente colectivo e daquilo que é esperado ver numa determinada época histórica. E, portanto, são essas pessoas com grande autonomia que, normalmente, se revelam essa autonomia, o poder, imediatamente entra em choque com elas.
Sempre que alguém revela um pensamento autonómico, no meio da massa de pensamento social, imediatamente, as estruturas do poder, começam a exercer pressão sobre as pessoas que estão a ser demasiado autónomas, que são um perigo para a estrutura social vigente.
Sara Aleixo - O poder o que é que acaba por fazer?
Normalmente, exerce uma grande pressão sobre esses seres autónomos, que, por essa pressão e porque são muito autónomos, acabam por geram obras ainda mais “perigosas” para o sistema, cada vez mais fortes, tornando-se ainda mais autónomas, porque têm conceito de liberdade pessoal e têm um pensamento muito pessoal, muito diferente do pensamento ou inconsciente colectivo social vigente num determinado momento histórico.
Mas, o que acontece é que desde a época hippie dos anos sessenta que a estrutura do poder se tornou bastante inteligente, ou seja, se calhar, a estrutura do poder sempre foi muito inconsciente, devido à sua atribuição ao mundo inanimado, ou seja, o poder vinha de Deus, para as pessoas, e há uma grande mudança radical histórica, em que as pessoas não tinham autonomia, nem podiam contestar o poder, não podiam fazer nada, porque ele vinha do inanimado, de fora, de Deus, era respeitado, não havia qualquer contestação.
E são esses seres autónomos, durante a cultura, que se vão revolucionando, vão sendo autónomos, e vão-se rebeliando contra essas coisas.
O que aconteceu é que, com a lógica do capitalismo e com a distribuição do poder, não por uma só figura nomeada por acto do poder, ou da guerra, ou das armas, ou do cosmos, de Deus, ele deixou de ser inconsciente e passou a ter consciência.
Os serviços de informação do mundo e do poder cada vez têm mais consciência sobre a manipulação das culturas e das massas.
Foi esta mudança radical que trouxe um novo fenómeno que é, persegue-se as pessoas autónomas mas cria-se-lhes duas hipóteses: os que são pouco autónomos, acabam por aceitar uma situação no poder e desenvolver a sua filosofia, já não como autónoma, mas dentro de uma instituição, numa lógica do poder.
E, depois, há aqueles que são irrevogavelmente indestrutíveis e que vão continuar...
Mas, o que é que o sistema faz a esses? Assim que eles morrem ou param o sistema pega no que fizeram, retira-lhes as categorias que lhe interessam, em termos culturais capitalistas e vende-os.
Ou seja, o espírito idealista "freak" dos anos setenta, hoje é vendido pelo sistema capitalista comercial e é perfeitamente integrado.
Por exemplo, na área do Rock’n’Roll, já não é possível fazer revoluções porque o sistema já chegou a esse nível de autoconsciência de delimitação de autonomia das pessoas.
Sempre que surge alguém que é autónomo em relação ao pensamento vigente duma cultura, a gente ou compra-o, ou mata-o e depois vende-o, e, portanto, há aqui uma nova lógica que é extremamente difícil de controlar, e era o que estava a falar há pouco.
Há muitos anos sempre houve 0.03 % da população, que eram os tais pensadores autónomos que fizeram as grandes revoluções culturais, sociais, da arte e da pintura, do cinema, mas o sistema capitalista ainda não tinha auto-consciência e não sabia lidar com os tais pensadores autónomos que desestruturavam sempre a sociedade em termos do futuro.
Reestruturavam a sociedade em termos de poder e, por isso, é que esta questão da autonomia vai sempre chocar com o grande fenómeno que é o poder, e o poder tem como objectivo diminuir a autonomia das pessoas.

"It is only in our decisions that we are important." - Jean-Paul Sartre

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